domingo, 29 de janeiro de 2012

Lançamento do livro "Republicanas quase desconhecidas"

 





Fina d´Armada deu-me a honra de ser eu a fazer a apresentação, no centro Democrático e Republicano de Fânzeres, lugar que muito prezo, do livro "Republicanas quase desconhecidas", no qual tenho uma pequena colaboração. Eis o que considerei dizer da Fina, então:
    
Conheci a Fina d´Armada entre 79 e 1980. Eu era jovem estudante  e a Fina com quem me encontrava na biblioteca ou em sua própria casa era para mim uma referência de afirmação da Mulher e de atracão pelo mistério. Esta relação empática manteve-se até hoje como bandeira de um espírito livre e portanto superior.
Em 1981 mudou-se para Rio Tinto, onde vive até hoje.
É autora de 11 obras individuais. A atual será a décima segunda.
No entanto escreveu 34 em co-autoria, das quais posso salientar a de carater local como
"Rio Tinto -Apontamentos Monográficos", "Monografia de Fânzeres" e "António de Sousa Neves”, biografia de uma personalidade de Fânzeres..  
Está representada na "Antologia de Poetas do Alto Minho", no "Dicionário de Mulheres Rebeldes", no "Dicionário Antológico de Artes e Letras de Gondomar" e em Espanha: no "Dicionário Internacional de Arte e Literatura" e  no de "Letras de Fronteira do Val do Miño Transfronteirizo", de autores portugueses e galegos. 
Foi condecorada pela UMAR e pela Câmara de Caminha "por uma vida inteira dedicada às letras, às artes e à singularidade de fazer a diferença".
“Republicanas Quase Desconhecidas” é um livro escrito por uma Mulher, qual carvalho se eleva  reto e ramifica, frutificando,  porque dá nome, às mulheres que, de forma anónima, implantaram os ideais republicanos.
Na verdade, a partir das solicitações feitas a investigagores e descendentes de republicanas, de norte a sul de Portugal, reúne  31 colaborações e faz referência a 33 concelhos por ordem alfabética, o número de vértebras que ”nos sustenta em pé” como ela afirma, numa tentativa bem sucedida de dar visibilidade às mulheres umas anónimas, outras menos, mas todas com ideais e ações de cariz republicano.
Põe em evidência  personalidades de todo este Portugal que, na atualidade, trabalham umas anonimamente outras porque a Fina conseguiu motivar para a pesquisa que ela ambicionava levar  a cabo. É assim um livro de autora mas que reúne muitas mãos e inteligências, num mundo onde o individualismo impera. Também aqui, numa citação criteriosa dos contributos, Fina d´Armada se afirma reta.
Ela própria tem a noção da importância deste ato ao escrever “ devo confessar que fazer esta obra foi das coisas mais bonitas que me aconteceram (… ) Para mim, tem sido sonho de uma vida dar visibilidade, trazer à luz, mulheres do meu país que fizeram mais do que as leis lhes permitiam. Obrigada a todos e todas, investigadores, colaboradores e descendentes, por acarinharem um pedacinho do meu sonho.”
Ela soube, certamente, através deste ato  realizar muitos sonhos de muitas famílias e pessoas, que desta forma passaram da sombra à luz.

A minha colaboração partiu, depois de um período em que vicissitudes da vida nos mantiveram afastadas, do fato de ter sido ouvida pela Fina quando apresentei a conferência  “República em Gondomar”, nos “Reencontros com a República”, nos quais, também  participou. Aí referi o pioneirismo da freguesia de  Valbom no que respeita os enterramentos civis. O Jornal de Notícias, em cinco de Abril de 1899 noticia grande motim no enterro civil de Luisa Rosa de Oliveira, mãe do propagandista das ideias sociais. António de Oliveira. Populares arremessando pedras tentaram impedir a saída do cortejo para o Cemitério do Prado do Repouso. A senhora estava ligada à Associação Propagadora da Lei do Registo Civil e desta forma o seu funeral constitui um cortejo cívico de propagação dos ideais sociais a que a defunta se tinha dedicado.
Fina d´Armada tem a noção de que faltam professoras republicanas.” Isto deve-se ao fato dos arquivos dos professores, a existirem, não terem sido localizados. Foram elas que espalharam o ideal republicano por quem não ia aos comícios”. Na verdade, em S. Cosme,
a professora regente, da escola do Souto, durante o período da Traulitana é obrigada a restituir a bandeira que tinha guardado em casa e convidada a tirar férias forçadas, o que a senhora rejeita.[1] Cremos que se trata de Dona Emília Augusta Lopes d´Araújo que faz parte da comissão de recenseamento das crianças em idade escolar em 1918 , mas, ainda, não encontrei o seu processo.
Com efeito, em 1910, as mulheres não tinham direitos políticos, não se podiam filiar em partidos ou associações sem prévia autorização dos maridos. Vários clubes punham mesmo restrição às mulheres, embora as deixassem participar nas comissões de festas e corpo cénico.
Por exemplo, a Escola Dramática de Valbom possuía uma comissão de senhoras para a realização de festas ou movimentos de carácter altruísta. D. Maria da Glória Barreto Costa, esposa do médico, denominado “João Semana de Valbom” pela sua bondade e dedicação, cognominada “avozinha da escola Dramática”, presidiu, várias vezes a essas comissões.
O Clube Gondomarense integrava após a república, republicanos de elevada instrução e intervenientes na política local, que procuravam cumprir a divisa do seu estandarte “Fiat Lux”, ou seja uma busca de luz e conhecimento, vinda da antiga filosofia iluminista liberal. Possuía um corpo cénico que procurava cumprir o tema da conferência proferida naquele clube por Camilo de Oliveira: “ O Teatro e a Escola como Fontes de Civilização”. Dele faziam parte senhoras como D. Leopoldina Ramos Cardoso, D. Margarida Dias e D. Albertina Pereira.
Durante a 1ª Grande Guerra, sobretudo mães e namoradas temem e expressam de forma mais evidente o seu sentimento de receio, dor e saudade.
Adere-se à Cruzada das mulheres portuguesas, presidida por Elzira Dantas Machado [2]a fim de dar assistência aos soldados portugueses que estavam na guerra e aos seus familiares.
Gondomar, um concelho rural, recebe a influência do Porto em muitos aspetos e torna-se muito dinâmico durante a 1º República, quer do ponto de vista reivindicativo, quer cultural.
Há diferenças entre as freguesias, podendo-se destacar Fânzeres e Valbom como mais conflituosas, já que aqui se confrontam com denodo republicanos e monárquicos. Rio Tinto salienta-se pela qualidade dos seus cidadãos, destacando, entre eles, Carlos Amaral que é torturado e morto, durante a Traulitana.
S. Cosme adopta uma postura moderada e pouco embarca em confrontos de monta. Camilo de Oliveira é ouvido com reverência e árbitro de conflitos, embora também tivesse sido preso com Carlos Amaral.
 Quanto a S. Pedro da Cova, a Junta reivindica melhorias para a freguesia, reverenciando a Companhia das Minas capaz de ser sua parceira em tais benefícios.
A República não satisfez o sonho das mulheres como não satisfez outros sonhos e por isso se perdeu.
De qualquer forma, Gondomar, tal como o país teve oportunidade de lutar por um ideal, praticar a intervenção cívica e aprender a tolerância.
Votando ao livro “Republicanas Quase Desconhecidas”,  Fina d´Armada refere que diversos concelhos fizeram plantações de carvalhos, em honra de republicanas locais. Em 2010, Fânzeres homenageou as mulheres republicanas com uma placa.
Usando as palavras de Fina,” no fundo é plantar a República, que significa plantar a Democracia, a qual exige perpetuamente ser replantada e regada por ideais de esperança.”
Este livro eleva alto o farol da igualdade, “caminho aberto, raiz da árvore da liberdade” que urge plantar cada vez mais. Fina d´Armada cumpriu a sua parte.




[1]  A. B. P. M. P. , A Voz de Gondomar, nº 2, 6 de Setembro de 1925, p. 1
[2] Cruzada fundada em 1916, pela esposa de Bernardino Machado